janeiro 27, 2011

Contos - Eça de Queirós (parte III)

Chego ao fim deste livro de Contos do Eça de Queirós, com uma opinião melhor acerca de livros de contos. Começo a compreender as suas vantagens e a beleza que pode existir em pequenas histórias.

Ficam aqui os últimos textos deste livro:

A Aia:
Mais uma história triste... Um conto onde o Rei morre e o sucessor directo é o seu filho, um bebé com apenas alguns meses de vida. Naturalmente que irá surgir alguém que vai querer disputar o trono e a única maneira de o conseguir é matando o príncipe. Quando o castelo é atacado, no calor do momento, a aia do príncipe troca-o pelo seu próprio filho, também ele um bebé de meses e é este que acaba por morrer. Uma história triste, muito triste.

As Histórias: Frei Genebro:
Frei Genebro era um santo homem que na sua vida havia cometido apenas uma má acção. E mesmo essa acção cometeu com boas intenções, para ajudar um amigo em dificuldades, e nunca tomou verdadeira consciência do que tinha feito. Quando morre, já velhinho, no purgatório, a balança das boas e más acções que cometeu na sua vida equilibra-se. Aquela única acção igualou todas as coisas boas que fez ao longo de anos e anos de uma vida dedicada aos outros. No fim, Frei Genebro é repelido do Paraíso.
Lição a tirar: existem actos que não merecem perdão, principalmente aqueles que nem remorsos nos provocam por nem sequer conseguirmos apreender a enormidade do que acabámos de cometer.

O Defunto:
Uma história de amor, ciúme e milagres. :) Uma história que está muito bem escrita e que me fez prender a respiração durante toda a caminhada de D. Rui de Cardenas até ao Cabril, tal era a expectativa. :)

Adão e Eva no Paraíso:
"Adão, Pai dos Homens, foi criado no dia 28 de Outubro, às duas horas da tarde... (...)Então, numa floresta muito cerrada e muito tenebrosa, certo Ser, desprendendo lentamente a garra do galho de árvore onde se empoleirara toda essa manhã de longos séculos, escorregou pelo tronco comido de hera, pousou as duas patas no solo que o musgo afofava, sobre as duas patas se formou com esforçada energia, e ficou erecto, e alargou os braços livres, e lançou um passo forte, e sentiu a sua dissemelhança da animalidade."
Eça conta aqui uma versão da história de Adão e Eva onde mistura muito bem a versão bíblica com a teoria da evolução. Gostei muito deste texto, principalmente porque, nesta versão, Eva come do fruto do Saber e é ela a responsável por humanizar Adão, que até aí pouco diferia dos outros animais no Paraíso. :)

A Perfeição:
Encontramos Ulisses na ilha Ogigia onde naufragou e foi acolhido pela Deusa Calipso. Há já sete longos anos que Ulisses, agora mais gordo e com mãos as macias, por nada ter de fazer a não ser satisfazer as vontades de Calipso, se encontra na ilha. Não tem meios para de lá sair e, a bem da verdade, falta-lhe também a autorização de Calipso. A Deusa pergunta-se porque haveria Ulisses de querer voltar para os braços da mortal Penélope? Ulisses explica-lhe que sete anos de perfeição é demais e anseia pela imperfeição da vida mortal. É com imensa alegria que Ulisses parte, numa jangada construída por ele, rumo à vida mortal, com todos os perigos que lhe são inerentes.

José Matias:
Uma história de amor que embora não tenha propriamente um final feliz - aparentemente Eça não é dos que gostam de terminar com o "Viveram Felizes para Sempre!" - tem o final que, no meio de tanto desencontro e más decisões, um dos protagonistas sentiu ser o final correcto. José Matias era homem sério, pouco dado a grandes sentimentos, até ao dia em que pousa a vista em Elisa. Elisa é sua vizinha e casada com Matos Miranda, um senhor com alguma idade e muito doente. Os dois mantêm uma relação puramente espiritual e durante 10 anos nunca trocaram um beijo sequer, trocando olhares e cartas por cima do muro que os separa. Quando Elisa fica viúva, José Matias parte para o Porto e recusa casar-se com Elisa. Porquê, só ele o saberá. Só ele saberá também porque continua a vigiar todos os passos de Elisa, mesmo depois de ela ter casado novamente, ter ficado viúva mais uma vez e ter tomando para amante, sem com ele casar, outro homem que não José Matias. Só ele saberá porque desgraçou a vida dele por amor de uma mulher que o amava de igual forma e que nunca deixou de o amar... Há pessoas que complicam e muito a vida! :)

O Suave Milagre e Um Milagre:
Dois contos que são uma versão ligeiramente diferente da que surge no conto Outro Amável Milagre (já comentado aqui).
Não sei porque decidiram incluir estes no livro, porque o Um Milagre é na sua essência igual ao final dos outros dois e, O Suave Milagre é algo que poderia ter sido acrescentado ao conto Outro Amável Milagre. Segundo nota no final do livro, estes três contos são três versões diferentes da mesma história, que Eça publicou em diferentes revistas e colectâneas da altura.


Nestes textos, surpreendeu-me o tema religioso estar tão presente, muitas das histórias eram sobre Jesus, porque nunca me tinha apercebido desse gosto por parte do Eça. Não foram esses contos os que mais me entusiasmaram, devo dizer, mas a escrita de Eça é sempre muito boa e até esses li com gosto.
É uma colectânea de textos que merecem ser lidos e por isso só posso recomendar a leitura dos mesmos. Destaco de entre todos estes os que mais me disseram: Memórias de uma Forca, A Catástrofe, Um Dia de Chuva, Civilização, O Defunto e Adão e Eva no Paraíso.

Boas leituras!

5 comentários:

  1. olá,

    Dos contos de Eça que li o meu preferido é "civilização". A cidade e as serras é este conto, mas alargado...Eça é um escritor actualissimo, é pena que muita gente se assuste com o tamanho ou com as descrições longas.

    cumps

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  2. Sara: É verdade o que dizes, de Eça ser um escritor muito actual. Já não lia um livro dele há algum tempo e foi muito bom regressar à escrita dele. :)

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  3. Penso que Eça via as coisas de um prisma diferente de todos nós... Via as coisas de maneira diferente ele presentia o improvável :)
    O que faz dele um exelente escritor...

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  4. Aconselho "O Mandarim" de Eça de Queirós :)

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  5. Eu gostaria imenso de saber mais sobre o porquê dos 3: "O Milagre" "Outro Amável Milagre" e "Um Suave Milagre" eu li o Outro Amável Milagre e tentei perceber o porquê, e pelo que eu percebi, Eça escreveu um deles 3 (não sei qual foi primeiro) e depois, Eça não gostou muito da forma como estava, então ele quis apresentar mais conteúdo, no fim, o que ainda não sei porque, apresentou os 3. Se alguém me pudesse ajudar a saber porquê, agradecia

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