fevereiro 17, 2013

A Passageira - Andrea Blanqué

Título original: La Pasajera
Ano da edição original: 2003
Autor: Andrea Blanqué
Tradução: Margarida Amado Acosta
Editora: Quetzal

"A professora Mann é uma mulher de trinta e tal anos que vive sozinha com os seus dois filhos, ensina Geografia num liceu nocturno e está divorciada de um homem que vive num país turbulento - Israel. Mais do que sentir ou pensar, prefere observar o mundo na qualidade de testemunha, fragmentando-o em detalhes de maneira incisiva, implacável, muitas vezes mordaz.
Viajante impenitente - como o fora anos antes, de mochila às costas, percorrendo o mundo sozinha, vivendo a espontaneidade, o exotismo, deitando-se com desconhecidos -, escreve a sua passagem pela vida «como se tudo se tratasse de uma longa viagem que há que registar», repleta de aventuras, juventude, amor e sexo, acidentes e atentados. O passado e o presente, e o mundo exterior e o interior, interagem e dão lugar a uma grande imprevisibilidade.
A Passageira é um romance diferente e cativante. Num registo coloquial, a autora mostra uma realidade em que o quotidiano é permanentemente comovido pelo insólito, pela diferença, levando-nos por caminhos pouco trilhados, no termo dos quais há sempre uma reviravolta que surpreende o leitor, confundindo-o e sugerindo-lhe um novo rumo para a imaginação."

Quando pegamos num livro sobre o qual pouco sabemos, de um autor, neste caso autora, para nós completamente desconhecida, não deixa de haver uma certa expectativa relativamente ao que vamos encontrar. Estamos na presença de uma escritora que passará a constar na lista de autores a seguir, ou será apenas mais um entre os muitos que já lemos e iremos ler? Andrea Blanqué, felizmente faz parte do primeiro grupo. A escrita é fluída e despretensiosa e a autora soube contar uma história com a qual os leitores se conseguem identificar. 

A professora Mann é uma mulher com mais de trinta anos, que vive no Uruguai com os dois filhos, frutos de um casamento que termina no dia em que o marido, David, parte para Israel, e ela lhe diz que "Já não quero ser tua mulher", recusando regressar com ele ao país onde se conheceram. Ensina Geografia num liceu nocturno, a alunos que, pelas mais diversas razões, não puderam terminar os seus estudos no ensino regular.
A mulher que conhecemos, com trinta e muitos anos, parece-se pouco com a rapariga de vinte anos que vemos descrita nos cadernos de capa dura que passaram a desempenhar um papel tão importante na vida desta mulher. Com vinte anos largou tudo e iniciou uma aventura, sozinha, com o objectivo de conhecer o mundo e as pessoas que nele se movem. Aos trinta e muitos anos, com dois filhos, um ex-marido em Israel, a sua única aventura pelo mundo não foi esquecida, mas faz definitivamente parte do passado. Não é uma mulher amargurada aquela que decide começar a escrever, não um diário ou mesmo uma auto-biografia, mas pensamentos e coisas que acontecem aos outros, aos que a rodeiam. Não é uma mulher cheia de arrependimentos a que conhecemos, no entanto sentimos nas suas palavras uma certa nostalgia pela vida e pelas aventuras que não chegou  viver depois de ter engravidado da filha mais velha e de ter casado com David, o homem que anos mais tarde a deixa sozinha com os dois filhos ao decidir partir para Israel, por razões que não são muito claras para nós. O que não sentimos na sua escrita é que, se pudesse, mudasse algo. Sentimos que voltaria a repetir cada passo que deu e decisão que tomou para estar precisamente no mesmo lugar, essencialmente pelos filhos.

Mann é uma observadora, demitiu-se um pouco de viver a sua vida e de procurar a felicidade, gosta de desconhecidos e parece ter alguma dificuldade em aprofundar as suas relações com os colegas de trabalho ou mesmo com as amigas, que refere muito amiúde. Quando se apaixona novamente é de forma tão inesperada e avassaladora que sente alguma dificuldade em lidar com a situação.  A escrita é, para ela, uma forma de se organizar mentalmente, de recordar quem era e de se mentalizar para o que é agora. Não escreve nada de comprometedor ou que não possa ser lido por estranhos, no entanto, vive com medo que um dia alguém leia o que escreveu. Não é por isso que deixa de o fazer, não pode, não enquanto tiver algo para dizer.

O livro está estruturado em pequenas secções numeradas, uma por cada entrada nova nos cadernos de capa dura da professora Mann. São "capítulos" pequenos o que permite que a leitura acabe por se fazer de forma rápida e fluída. Para além de escrever um pouco sobre si, sobre a sua família e sobre a viagem que fez quando tinha vinte anos, o livro aborda outros temas, como o suicídio, o amor e de como é importante sabermos crescer, envelhecer, adaptando-nos aos diferentes desafios que surgem com a idade. A aventura é permitida em todas as idades, mas cada idade tem necessariamente de proporcionar aventuras diferentes. :)

Gostei do livro e, embora tenha achado que por vezes ela se repetia um pouco nas ideias, também acho que essa repetição tornou o relato mais realista.

Vou ter de me manter atenta à obra de Andrea Blanqué, parece-me promissora.

Obrigada pela sugestão, Dona-Redonda. :)

Boas leituras!

Excerto:
" Sou uma mulher que escreve num caderno quando os filhos não estão. Não sei se amanhã voltarei a escrever, ou na semana que vem. Talvez abandone o caderno neste preciso instante ou dentro de algumas páginas. Talvez chegue até ao fim e precise de ir comprar outro.
Não releio o que escrevo, mas sei que falei demasiado sobre o David. Tenho de render-me perante a humilde realidade de que tenho trinta e sete anos e um divórcio, e que estou a escrever num caderno de capas duras sobre um marido inexistente."

2 comentários:

  1. Gostei muito deste livro e de ler agora este texto sobre ele :)
    um beijinho
    Gábi

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  2. Olá!
    Tenho um selinho para ti no meu rol. Passa por lá.
    Bjs.

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