março 24, 2013

O Caso das Mangas Explosivas - Mohammed Hanif

Título original: A Case of Exploding Mangoes
Ano da edição original: 2008
Autor: Mohammed Hanif
Tradução: Teresa Curvelo
Editora:Porto Editora

"No dia 17 de Agosto de 1988, o presidente paquistanês Zia ul-Haq morreu num acidente aéreo. No avião presidencial viajavam igualmente o chefe dos serviços secretos e o embaixador dos Estados Unidos. Não houve sobreviventes e ainda hoje a razão que levou à queda do avião continua envolta em mistério. O acidente ficou a dever-se a:
Falha mecânica?
Falha humana?
Impaciência da CIA?
Maldição de uma cega?
Generais descontentes com as suas pensões de reforma?
A estação das mangas?
Ou o responsável terá sido o próprio narrador, Ali Shigri, um jovem cadete da Força Aérea, que nos relata a sua participação nos acontecimentos?
Com um humor ácido e um ritmo trepidante, digno dos melhores thrillers políticos, Mohammed Hanif retrata sem contemplações os aspectos mais absurdos da vida militar durante os últimos dias de vida do cruel ditador Zia ul-Haq, expondo as manipulações de todos pois implicados que, com a sua miopia política, contribuíram para o auge do fanatismo radical."

Depois de um livro tão pesado como Autópsia de um Mar de Ruínas do João de Melo (comentado aqui), andava com vontade de ler alguma coisa divertida e leve. Este sobressaiu na estante, pelo título, pela cor, mas essencialmente porque veio como oferta quando comprei O Centenário que Fugiu pela Janela e Desapareceu do Jonas Jonasson, já lido (e comentado aqui) e que me divertiu imenso, achei que este podia ser na mesma onda. :) É divertido, mas a onda não é a mesma. Este tem um sentido de humor mais negro, o tom é mais satírico e as personagens não são tão facilmente acarinhadas como os idosos de Jonas Jonasson. Deixemos, portanto, de comparar o incomparável. :)

O Caso das Mangas Explosivas leva-nos até ao Paquistão. Em plena ditadura militar liderada pelo General Zia ul-Haq, nos anos de 1978 a 1988, ano em que morreu quando o avião onde seguia se despenhou. É no momento em que Zia entra no avião, acompanhado pelo embaixador dos EUA, Arnold Raphel, pelo general Akhtar Rahman chefe maior das forças armadas paquistanesas e outras altas patentes do país, que a história narrada por Ali Shigri tem início.
Sabemos que todos os que embarcaram no C130 presidencial morreram e Shigri dá a entender que poderá ter tido alguma participação na morte trágica do presidente Zia. Será que teve?

Shigri leva-nos a percorrer os meses que antecederam a queda do avião e a morte de Zia. Foi um acidente? Foi um homicídio? Quem era o alvo e porquê? Vamos descobrindo tudo isso, ao mesmo tempo que vamos conhecendo a ditadura militar de Zia, um homem temido por todos, que aqui surge mais como o rosto da repressão levada a cabo pelos seus subordinados, sem que pareça controlar muito do que se vai passando no seu país. Vive numa espécie de bolha, sem qualquer noção de como vive o povo que tanto diz amar. Paranóico com a sua segurança, vive aterrorizado com a ideia de que um dia o possam matar, o que o afasta ainda mais da realidade que o rodeia. Fanático religioso impõe a todos os que o rodeiam a mesma conduta moralmente irrepreensível. O ditador parece viver numa outra dimensão, rodeado por gente interesseira e ambiciosa e que não o leva muito a sério, conspirando para ocupar o seu lugar à frente dos destinos da jovem nação.

O exército e a comunicação social controlam completamente tudo o que se passa no país, inventam notícias, controlam todo a informação que passa para o exterior, encenando celebrações para que a imagem do presidente seja imaculada.
Junto ao presidente Zia surgem os americanos, representados pelo seu embaixador destacado para o Paquistão, Arnold Raphel, enviado para garantir que a luta contra os comunistas russos se mantém activa e viva, apoiando os afegãos e paquistaneses nessa luta contra os infiéis.

Embora nada do que descrevi até agora pareça particularmente divertido, a verdade é que o tom com que são descritas as situações aligeira o que está subjacente a um período da história paquistanesa que terá sido tudo menos divertida. O tom é de ironia e de gozo, de exagero, para ridicularizar todas estas altas personalidades que se julgam imortais e omnipotentes.

Gostei porque é um livro bem escrito com uma história que prende, com personagens bem desenvolvidas e com quem criamos empatia. Gostei do General Zia, que deve ser o estereótipo que se aplica a quase todos os ditadores passados, presentes e futuros, a viver num auto-deslumbramento e a pensar que manda realmente alguma coisa, quando na realidade é apenas um fantoche, facilmente manobrável até que um dia é posto de parte, quer por outro ditador quer pelo povo que julgava complemente domesticado. :)

Gostei. Não é uma obra-prima mas é bom o suficiente para que o recomende sem qualquer hesitação.

Boas leituras!

Excerto:
"Quando Zia lhe ordenou que arranjasse um buraco no horário de maior audiência para o Programa de Reabilitação das Viúvas do Presidente, o ministro começou por se mostrar relutante.
- É o que fazemos sempre no Ramadão, sir - murmurou o ministro da Informação em tom de desculpa. Não sabia muito bem como reunir um tal número de viúvas nessa época do ano.
- Existe alguma lei neste país que me proíba de ajudar os pobres no mês de Julho? - volveu, irritado, o general Zia. - Foi feito algum estudo económico que diga que as nossas viúvas necessitam de ajuda durante o Ramadão mas não amanhã de manhã?
O ministro da Informação cruzou as mãos na braguilha e assentiu com entusiasmo.
- É uma ideia brilhante, sir. Seria uma excelente alternativa para a agenda noticiosa. As pessoas começam a perder o interesse por toda essa embrulhada de os soviéticos se irem embora e os nossos mujahideen afegãos se andarem a matar aos tiros uns aos outros.
- Certifique-se de que as notas de cem rupias são novas. Essas velhas adoram o cheiro do dinheiro fresco."

Sem comentários:

Enviar um comentário